quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Ermal - Obituário de 2009 (2ª Parte)

Dias 2 e 3- Let there be Rock!

A manhã havia começado da pior forma possível e caso não houvesse café nas redondezas o cenário ficaria verdadeiramente apocalíptico. Dirigimo-nos à barraca de comes e bebes do parque de campismo, onde, muito a medo, pergunto se servem aquela bebida tão vital para a nossa existência. Quando a senhora por detrás do balcão me confirma que não só tem café como também tem leite, atestando-se então a possibilidade de conjugar os dois num único recipiente, juro que senti um calorzinho a percorrer-me a espinha. Após um pequeno-almoço decente conseguíamos finalmente avistar a tal luzinha no fim do túnel, talvez os próximos dias não se revelassem um autêntico inferno afinal de contas. Depois do belo do banho de água fria e decididos a desanuviar as ideias, rumamos à vila de Vieira do Minho. De volta à civilização compensamos a terrível noite anterior com um belo almoço de vitela assada, um autêntico regalo. De barriguinha cheia achamos por bem dar um passeio para apreciar a vila, e bem cedo percebemos que não há rigorosamente nada para apreciar. Contudo, neste aparente marasmo dá-se um momento fulcral. Eis que a minha companheira de armas tem duas ideias de uma incrível sapiência: em primeiro lugar, mudar a tenda para um local o mais afastado possível do palco, e depois, comprar tampões para os ouvidos na farmácia mais próxima. Uma resolução apenas comparável à de Kant quando este decidiu estudar filosofia... O autocarro do inferno devolve-nos ao recinto, e nós, pobres criaturas preparamo-nos para a destruição sónica.

No meio do nada, mesmo em frente de um pequeno lado fluvial, assomam-se dois palcos de aspecto ameaçador. A temperatura amena-se no fim de tarde, concedendo novo alívio aos músculos saturados pelo calor, e neste cenário de desastre anunciado eis que ela surge novamente, como um fantasma ensombrado entretanto esquecido: a fome de música. Mesmo que alguns dos nomes se revelassem pouco sonantes, nenhuma das bandas deixou os seus créditos por mãos alheias:

Disbelief: Podemos ter chegado um pouco atrasados, mas ainda que acidental, esta foi sem dúvida a melhor maneira de dar inicio ao nosso masoquismo auditivo. Assim que chegamos ao recinto damos de caras com este mui competente e oleado colectivo gêrmanico, que com facilidade fazia as delícias dos presentes. Uma sucessão constante de músicas a meio tempo, mas com um ritmo que pesava toneladas, e sempre com uma execução exímia. Apresentaram-se coesos, sem pretensiosimos ou manias de vedeta, e.... devastadores... tal e qual como deve ser!

Obituary: Uma espectacular viagem pelo tempo. A música despojada, rude e directa dos anos 90. Estes senhores norte-americanos provaram a tudo e todos porque continuam a ser uma das bandas mais emblemáticas do meio e do movimento em que se inserem. A sensação do ouvinte é a de estar frente a um tsunami sonoro capaz de esmagar tudo em seu redor. O som que provinha das maciças colunas estava soberbo, assim como a forma em que a banda se encontrava. De salientar a prestação do vocalista, pois embora já tenha a minha dose de concertos, não recordo ter alguma vez testemunhada tal potência vocal: em boa verdade o digo, a voz daquele homem conseguia acordar um morto e pelas piores razões! Todavia, para além de apreciar o concerto não pude deixar de notar nas gadelhas destes músicos, juro que qualquer um deles podia facilmente fazer um anúncio da Panténe... os ares da Flórida devem fazer maravilhas...

Sepultura: Num autêntico golpe de autoridade, a banda brasileira demonstrou estar à altura do seu tremendo legado. O grande trunfo dos brasileiros foi sem dúvida o line-up, a escolha de temas não podia ter sido melhor: as músicas novas e menos conhecidas funcionaram na perfeição em palco, os velhos clássicos foram todos eles revisitados, havendo ainda espaço para tirar umas autênticas jóias do fundo do baú para gáudio de todos (principalmente aqui do careca - nunca pensei assistir ao vivo às melodias que marcaram a minha pré-adolescência, nomeadamente os nostálgicos "Manifest", "Territory", "Innerself" ou "Arise". No final confirmei ter assistido a um momento muito especial, particularmente para mim.

Korpiklaani: Ora aqui está uma banda que já a algum tempo vinha a criar grandes expectativas, e normalmente quanto maior a expectativa maior a desilusão... excepto no caso destes carismáticos finlandeses. Pergunte-se: quais as probabilidades de ver uma multidão de metaleiros a dançar alegremente, havendo inclusive direito a fazer o comboio? Muito reduzidas, mas ainda assim foi o que aconteceu para espanto de todos. A boa disposição que brotava a jorros do palco foi contagiante e viciante, Quanto à banda, merecem de longe nota positiva pelo seu esforço em criar o ambiente certo para o som que produzem, por muito boa que uma banda seja, por vezes é necessário aquele bocadinho extra para cativar o público, e neste ponto os Korpiklaani foram reis e senhores. Até o colossal "prego" que o baterista mandou lá para o meio da actuação, em que tocou completamente fora de ritmo, passou despercebido pois foi apenas mais um elemento para juntar ao bom humor que reinava. A nota negativa vai para o técnico de som que deixou a banda com o pior som de todo o festival... desgraçado...!

Blind Guardian: Banda-mor do Heavy Metal de origem alemã e bastião do Power Metal europeu. Decidi dar-lhes uma hipótese, afinal de contas deveria haver uma razão concreta para o seu sucesso... Assisti a três músicas e comecei a bocejar... há certas coisas que pura e simplesmente escapam ao meu entendimento...

E assim foi...Quatro dias mui bem passados e em excelente companhia...mas cansativos como o caralho!! Pena foi que os concertos começassem ao meio-dia, acabando por prejudicar as bandas nacionais que acabaram provavelmente a tocar pró boneco. Embora estivesse solidário para com elas, almoço é almoço!

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Ermal - Obituário de 2009

Existem variadas maneiras de expressar o amor pela música, tais como comprar um CD novinho em folha, ir a um concerto ou cantarolar aquela musiquinha que não sai da moina...porém para um apaixonado por heavy metal, o sofrimento auditivo tem de ser transposto para a pele, assim sendo que melhor maneira de provar a nossa paixão musical que aguentar quatro dias chinfrineira lancinante, a dormir em tendas rodeadas de bêbedos num parque saturado de poeira, e com banhos frios como único consolo! É verdade meus amigos, fui ao Ermal e voltei para contar.

Dia 1 - Their Satanic Majesties require and request

Após uma fatídica viagem de cinco horas finalmente lá chegamos ao parque de campismo que a princípio até parecia amigável (quanta ingenuidade). A tenda foi cortesia da minha companheira de armas que desde o início me garantira que montar a dita cuja não seria problema... até que chegou o momento de passar à prática. Parecíamos duas bestas a mirar ora as instruções, ora os compostos que deveriam formar uma tenda. Passado uma hora sem nunca saber ao certo que raio estávamos a fazer, uma tenda surgiu diante nós, e até bem montada! Numa situação tão afortunada o comum ser humano até agradeceria ao Divino pela boa sorte, contudo o Divino está bem longe do Ermal nesta altura do ano. Impor-se-ão porventura outras divindades...? Quem sabe...? Terminado o primeiro suplício ergue-se o ânimo, mas não muito, pois a viagem longa associada com uma noite mal dormida dão lugar a um latejar constante na caixa craniana, que nem uma imperial fresquinha faz esquecer. Mal a noite cai já só apetece experimentar o colchão e saco cama novos. O saco cama é aconchegante e o colchão não deixa sentir o chão cravado de raízes, finalmente uma oportunidade de recarregar baterias... pelo menos até começar o check-sound para o concerto dessa noite... Aparentemente estávamos a acampar mesmo ao lado do palco principal. O check-sound termina, reina novamente a calma... até que começa o único concerto da noite. Escusado será dizer que o nosso almejado descanso ia de mal a pior, mas aguentámo-nos que nem uns valentes, às voltas nos sacos camas enquanto fingíamos algum conforto, até que o concerto por fim finda. Agora sim, íamos descansar para acordarmos cheios de energia e estaleca. Ou pelo menos assim queríamos que fosse, quando eles chegaram e se acercaram da nossa tenda: um grupo de metaleiros bêbedos com sotaque nortenho, que provavelmente não tinham sofrido nada para ali chegar, ao contrário de algumas almas oriundas da agora longínqua Almada. Juro que foi quase até ao amanhecer a levar com os berros e com a conversa de merda. O sono chegou tarde e aos bocados. Os olhos entreabriram-se sem vontade e o primeiro dia começava mal...