Ora bem sei que ultimamente tenho estado um pouco ausente do meu próprio blog, mas de forma alguma este saiu da minha memória. A bem da verdade é que nos últimos dias a minha cabeça tem andado demasiado ocupada com questões, indagações e divagações filosóficas diversas, todas elas cortesia do Mestre. Esta não é de qualquer forma a primeira oportunidade que se me apresenta para partilhar de algumas das ideias do Mestre, mas desta vez não estava de facto preparado para a genial obra-prima que nos últimos tempos tanto prazer me tem dado. Uma vez que a ele devo tantas soberbas clarificações e linhas de (ir)raciocínio, isto já para não falar do próprio nome deste humilde espaço virtual, achei por bem trazer até vós algumas extrapolações da autoria de um verdadeiro mestre da literatura:
"Há qualquer coisa de belo na alegria, na ausência de dor, nesses dias suportáveis e amainados em que nem a dor nem o prazer ousam gritar, em que tudo sussurra e anda de mansinho em bicos dos pés. Mas comigo, infelizmente, acontece que é precisamente essa alegria que eu menos tolero; após algum tempo ela torna-se-me insuportável, de odiosa e repugnante, forçando-me a fugir, de desespero, para outras temperaturas, porventura trilhando caminhos de luxúria, mas se
necessário for também de sofrimento. Quando passo algum tempo sem alegrias nem penas, respirando a sofribilidade morna e insípida dos chamados dias bons, nasce na minha alma de criança um tormento, uma revolta tão inflamada, que atiro a enferrujada lira da gratidão ao beatífico rosto do deus meio-adormecido da satisfação, e preferia uma dor francamente diabólica fervilhando dentro de mim a esta aprazível temperatura ambiente. Irrompe então em mim uma feroz avidez de sensações, de emoções fortes, uma raiva contra esta vida descolorada, banal, estandardizada e esterilizada, e um avassalador desejo de arrasar qualquer coisa, um armazém ou uma catedral, sei lá, ou eu próprio, pôr-me a fazer disparates arrojados, arrancar perucas a uns tantos ídolos venerados, proporcionar a uns tantos rapazinhos estudantes em revolta o ansiado salto até Hamburgo, seduzir uma miúda ou torcer o pescoço a uns tantos representantes da ordem universal burguesa. É que não havia coisa que eu mais detestasse, abominasse e execrasse no mais íntimo do meu ser: essa beatitude, essa saúde, esse bem-estar, esse acalentado optimismo do burguês, essa cultura farta e próspera do medíocre, do normal, do mediano."

-H.H. in "Der Steppenwolf", 1927.
1 comentário:
Simplesmente maravilhoso... Obrigada por este bocadinho amigo, gostei imenso... :)
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